Selma Pereira


Nem a Chuva Detém o Proletariado
Nem a Chuva Detém o Proletariado

Ela cantou na minha janela a noite toda.
Cantou a madrugada inteira.
Pensei comigo: Não tem jeito!Tenho que ir trabalhar mesmo com essa cantoria.
Choveu muito. Era chuva que Deus dava!!
Pensei comigo: Não vai ter nenhum filho de Deus na rua.
Me enganei. A rua tava lotada. Cheia de gente...
 
Mas o que me chamou atenção mesmo,
Não foi o rio Todos os Santos cheio,
Não foi a calçada lavada e nem as lesmas andando nas ruas.
Tinha ratos também saindo dos bueiros.
Mas não foi isso que chamou minha atenção.
 
Foi os guarda-chuvas!
Sombrinhas!
Era lindo de se ver.
De todos os tamanhos, de todas as cores, de todos os jeitos.
Tinha rosa de rendinha para as mulheres delicadas.
Tinha de arames mais grossinhos para mulheres de atitude.
Tinha guarda-chuvas pretos imensos para homens machos.
Tinha guarda-chuvas imensos, xadrezes, para pessoas (unissex) escandalosas.
 
Tinha para todos os gostos.
Grandes, pequenos, redondos, quadrados.
Pontudos, de ponta fina, ponta grossa e sem ponta.
 
E tinha capa de chuva.
A maioria era amarela. Mas vi uma transparente. Vi uma rosa. Vi uma preta.
Eu vi tudo!
 
Choveu muito em Teófilo Otoni. Encheu o Todos os Santos!
Tinha lesmas e ratos na rua. Nos lixos. Homens de pinto morumbado.
Mas todos foram trabalhar.
Porque aqui, senhores, nem a chuva detém o proletariado.